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O ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta sexta-feira (23) para manter a decisão da Corte que invalidou o entendimento que permitia a chamada “revisão da vida toda” nas aposentadorias.
No voto, o magistrado rejeita dois recursos contra a decisão do STF, de março deste ano.
Na ocasião, a Corte contrariou os interesses dos aposentados, que buscavam com a revisão aumentar os valores recebidos da aposentadoria. A posição foi uma mudança do próprio entendimento do tribunal, que em 2022 validou a revisão da vida toda.
Para Nunes Marques, os recursos apresentados pelo Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM) não têm condições de alterar a decisão do STF e nem de limitar seus efeitos.
Segundo o ministro, a tese da revisão da vida toda (fixada pela Corte em 2022), ainda é discutida por meio de recursos, e não está encerrada. Assim, esse entendimento acabou sendo superado pelo julgamento de duas ações mais antigas, em março deste ano.
O julgamento dos recursos é feito em sessão virtual que começou 0h desta sexta (23) e vai até 30 de agosto. No formato, não há debate entre os ministros, que apresentam seus votos em um sistema eletrônico.
Recurso
O recurso apresentado pelo Ieprev buscou garantir o direito da revisão aos aposentados que já haviam acionado a Justiça depois da decisão de 2022.
O instituto citou dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de que existem no país 102.791 ações que tratam do tema e teriam condições de serem beneficiadas com a revisão, um número considerado pequeno pela entidade.
Além disso, conforme o recurso, 66 mil ações (pouco mais de 65%) discutem valores de até 60 salários-mínimos.
Uma estimativa de impacto tratada como “pessimista” pelo Ieprev é de R$ 3,1 bilhões em um período de dez anos.
“O impacto financeiro mais provável, baseado em estudos concretos e não em ‘chutômetro’ (como bem colocado pelo próprio Ministro da Previdência, Dr. Carlos Luppi), seria de R$ 210 a R$ 420 milhões ao ano, o que resultaria, no decorrer de 10 anos, na monta de R$ 1,5 bilhões (considerando o lapso temporal e óbitos ao longo dos anos, dada a idade dos jurisdicionados) ou, NA PIOR DAS HIPÓTESES, em R$ 3,1 bilhões”.
Em março de 2024, por 7 votos a 4, os ministros do STF entenderam que os aposentados não podem optar pela regra mais vantajosa na hora de calcular seu benefício. Isso, na prática, derrubou a “revisão da vida toda” que havia sido validada em 2022, em outro processo.
A decisão foi dada em duas ações que questionavam pontos de uma norma de 1999 que alterou pontos da Lei de Benefícios da Previdência Social.
Ao validar um desses pontos, que trata de uma regra para o cálculo da aposentadoria, os ministros votaram para que ela tenha que ser seguida obrigatoriamente. Isso barra, na prática, o poder de escolha do aposentado, que amparava a possibilidade de ele optar pela regra da “revisão da vida toda”.
Há grande interesse do governo federal em evitar a autorização para revisão das aposentadorias, pelo alegado gasto que provocaria aos cofres públicos. Uma estimativa inicial de impacto foi calculada em R$ 480 bilhões, nume cenário “pessimista” em que todos os aposentados pudessem revisar seus benefícios.
A revisão
A “revisão da vida toda” tem esse nome porque se refere ao recálculo do valor da aposentadoria considerando todas as contribuições feitas durante a vida do trabalhador, inclusive aos anteriores à adoção do Plano Real, em 1994.
Pela regra de transição adotada depois da reforma da previdência de 1998, só deveriam ser consideradas para o cálculo da aposentadoria as contribuições feitas a partir de 1994.
A regra foi adotada para não prejudicar o trabalhador pela elevada inflação antes do Plano Real. Ocorre que, em alguns casos, houve prejuízo, e o trabalhador receberia uma aposentadoria maior se pudesse ser enquadrado na regra definitiva, e não na de transição.
Em dezembro de 2022, o STF decidiu que o aposentado poderia optar pela regra que fosse mais vantajosa. Assim, validou o recálculo considerando as contribuições feitas durante sua vida pré-Plano Real (a chamada “vida toda”).
Mudança de posição
Em março, no entanto, sete ministros entenderam que a regra de transição estabelecida em 1999 é constitucional e, portanto, deve ser aplicada necessariamente a todos que se enquadrem nela.
A posição foi apresentada pelo ministro Cristiano Zanin e acompanhada por Flávio Dino, Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Roberto Barroso e Nunes Marques.
Ficaram vencidos os ministros Alexandre de Moraes, André Mendonça, Edson Fachin e Cármen Lúcia.
Pela tese apresentada por Zanin e que teve a concordância da maioria, a regra de transição deve ser seguida obrigatoriamente e sem exceção.
“O segurado do INSS que se enquadra no dispositivo não pode optar pela regra definitiva prevista no artigo 29, incisivos I e II, da lei 8.213, de 1991, independentemente de lhe ser mais favorável”.
Como o entendimento derruba a possibilidade de o aposentado optar por outra regra, não há mais como o aposentado requerer o recálculo da aposentadoria usando todas as contribuições de sua vida.
Ações
A tese e o entendimento fixado contra a revisão da vida toda foram estabelecidas no julgamento das duas ações que contestavam alterações na Lei de Benefícios da Previdência Social feitas em 1999.
As ações foram apresentadas pelo PCdoB e pela Confederação Nacional Dos Trabalhadores Metalúrgicos, em 1999.
Em 2000, o STF negou liminar nos processos e manteve a validade dos dispositivos questionados. Essa liminar vigorou até 21 de março de 2024, quando os ministros julgaram o mérito do caso.
Além de validarem a regra de transição adotada após a reforma da previdência de 1998, tornando-a obrigatória, o STF declarou constitucional a criação do fator previdenciário — fórmula matemática usada para definir o valor das aposentadorias do INSS.
A Corte também invalidou, por maioria, a existência de um período de carência para que mulheres autônomas usufruam do salário-maternidade.
Outro processo
No processo que trata especificamente da revisão da vida toda, a Corte havia validado a possibilidade de revisão, por 6 a 5, em dezembro de 2022.
O INSS, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), apresentou recurso questionando a decisão e pedindo uma limitação à sua aplicação.
O julgamento do recurso começou a ser feito em sessão virtual, e já havia quatro votos para manter a possibilidade de revisão da vida toda, com uma limitação temporal.
Um pedido do relator, Alexandre de Moraes, mandou o caso para ser analisado no plenário físico, zerando os votos já apresentados.
O caso não foi retomado desde então.